Humor nas relações de casal**

Solange Maria Rosset

 

Bom humor pode salvar a relação nas horas de grandes dificuldades

O processo de ser um é, com toda a certeza, o mais complexo e cheio de nuanças que se pode vivenciar. Ele possibilita muito aprendizado, no entanto engloba também dificuldades e dores. Nessas ocasiões, o humor pode se mostrar muito importante. Torna tudo um pouco mais leve, relativo e interessante. Desse modo, os problemas muitas vezes deixam de ser barreiras.

Lidar com as questões do amor, crescendo e aprendendo, pressupõe uma grande dose de disponibilidade e paciência. Cada casal, dependendo do seu padrão de funcionamento, pode e precisa descobrir estratégias e instrumentos para facilitar a passagem pelos maus momentos, neutralizar os possíveis ataques e usufruir os bons períodos. Uma das mais úteis e funcionais que pode desenvolver é o uso do humor na união. Possibilita que as dificuldades deixem de ser barreiras e torna tudo mais leve, relativo e interessante.

Mas há alguns aspectos importantes que precisam ser avaliados no uso do humor.Um deles é o de não confundi-lo com ironia. Esta não é uma virtude, mas uma arma; é o riso mau que fere. É uma das defesas mais destruidoras na comunicação do casal. 

Outra questão é que, antes de usar o humor com o outro, é preciso aprender a usa-lo consigo mesmo. Significa rir das próprias imperfeições, dificuldades, impossibilidades. Brincar quando a questão é com o outro e levar a sério se é consigo pode piorar a dor da relação. Ter senso de humor pressupõe ter humildade, não se levar muito a sério, não trilhar o caminho da perfeição e das certezas. É acrescentar generosidade, doçura e compaixão ao relacionamento.

Nos momentos de brigas, inevitáveis, o bom humor é uma qualidade atraente, bem como uma atitude sábia para ser usada. O casal pode criar formas  funcionais de lidar com desavenças, evitá-las ou não permitir que deixem marcas excessivamente doídas.

O amor envolve ternura, amizade, compaixão, lealdade, delicadeza. Alimentá-lo é uma das tarefas mais difíceis e importantes.Se deixarmos que se organize sozinho, as agruras do dia a dia, a rotina, as diferenças e as dificuldades acabarão transformando amor em uma lembrança nostálgica. Contudo, se for enriquecido, alimentado diariamente, será fonte de bem-estar, prazer e humanização. Fazer isso com humor fará diferença na vida dos parceiros.

Conheço casais que, no dia a dia, usam estratégias que facilitam o exercício do bom humor. Penduram na parede ou deixam à vista fotografias pessoais, ou do casal, em situações que foram bem humoradas ou lembram bons instantes; penduram tiras de quadrinhos favoritas ou que mostrem aspectos divertidos e leves da vida pessoal e conjugal; no espaço do casal, rabiscam citações que estimulam a veia cômica do par; deixam, nos locais em que costumam brigar, bilhetes, frases ou figuras que facilitem a lembrança de que podem se desacertar, mas que isso pode ser passageiro e engraçado. Assim, vão encontrando jeitos para lidar com as disputas, assumindo as diferenças e negociando as soluções de forma mais agradável.

Quando duas pessoas escolhem-se para ser um casal, vão estruturar sua forma única de ser; aos poucos, vão estabelecer seu padrão de funcionamento. Tal padrão estrutura-se a partir do padrão de funcionamento de cada um dos membros, e da relação que se estabelece entre eles, e a partir do que cada um dos membros trouxe da sua família de origem. São diferentes pontos de vista, oriundos das leis internas aprendidas e assentadas durante os primeiros anos de vida na família natal. A estrutura da relação dos parceiros permite e possibilita dar continuidade ao processo de crescimento individual iniciado nas famílias em que cada um nasceu e cresceu. Nesse sentido, um casal que inclui o humor na sua relação, e depois na familiar, ensina e transmite aos filhos uma forma mais leve de se relacionar. Aos poucos, os relacionamentos familiares e sociais podem ficar melhores.

**Texto publicado na sessão AMOR  da revista CARAS  número 616 – 24/8/2005