As dificuldades e possibilidades do trabalho da Terapia Relacional Sistêmica nas famílias atuais*

Solange Maria Rosset

Setembro de 2015

A. Situações familiares atuais

a. Famílias “modernas”

Antigamente, o que dava mais tranquilidade para todos os envolvidos, era que os papéis e tarefas  eram claramente definidos, as regras eram implícitas, e a hierarquia inquestionável.

Hoje, nada mais é claramente definido. Papéis e tarefas mudaram muito e dependem de toda a organização familiar, e varia de acordo com as necessidade, dificuldades e situações de cada família. As regras são aleatórias e raramente são contratadas de forma funcional. A hierarquia familiar é centrada nas necessidades dos filhos e no poder que eles têm.

E isto aumenta a angústia dos elementos da família e é um desafio constante para os terapeutas. Nada é bom ou ruim melhor ou pior, mas adaptar-se à essas mudanças e desafios é um trabalho constante para todos.

Muitas dessas famílias “modernas” apresentam:

• Papéis em constante redefinição
• Regras  muito flexíveis e negociáveis
• Hierarquia questionada
• Superproteção e facilitação da vida dos filhos
• Exigência constante de superação
• Filhos sem tarefas em casa; só direitos e sem deveres
• Pais inseguros com relação aos limites e aos direitos e culpados
• Parâmetros sexuais confusos
• Famílias reconstruídas com aumento de  dificuldades e exigências

b. Famílias com estruturas não tradicionais

A estrutura famíliar sofreu muitas mudanças nas últimas décadas, e hoje encontramos famílias com variadas configurações. Isto leva à muitas dúvidas e angústias sobre qual são as formas mais  adequadas de lidar com as novas situações familiares.

Essas questões surgem nos integrantes das famílias, nos terapeutas e em todos os profissionais que interagem com elas.

Encontramos famílias com configurações muito diferentes da tradicional família pai, mãe, filhos.

• Famílias mono parentais
• Famílias de casais homoafetivo
• Famílias com agregamento de muitos subgrupos
• Adoções uni parentais
• Casais/famílias vivendo em casas separadas
• Filhos de inseminações, em situações variadas
• Filhos adultos continuam morando e dependendo dos pais
• Soluções inusitadas nos divórcios e separações

Com essas novas configurações e situações, além das dificuldades com a criação dos filhos e adaptações necessárias, inerentes a todas as famílias, surgem também problemas novos.

• Afastamento na relação com pais
• Funções parentais confusas
• Envolvimento de crianças em guerras relacionais de adultos          
• Distanciamento de vínculos familiares da família extensa     
• Dificuldades nos sentimentos de pertencimento         
• Confusões na estruturação de identidades pessoais e familiares

B. Trabalho com as famílias atuais

Além das questões a serem trabalhadas, focadas nas dificuldades da família específica, algumas propostas devem ser examinadas, nas famílias atuais.

• Preservar o sistema conjugal, usando o relacionamento para crescer e aprimorar.
• Não depositar o filho nos eventuais novos parceiros.
• Possibilitar que a criança aprenda as várias possibilidades de triangulação.
• Não deixar que o excesso de pessoas no sistema interfira no relacionamento conjugal e amoroso e na relação com os         filhos.
• Negociar regras, tarefas, mudanças com todos os subsistemas envolvidos.
• Limpar as confusões e desacertos com boa vontade e paciência,    respeito, compreensão e compaixão
• Definir tarefas e responsabilidades para os filhos (criança,    adolescente  ou adulto).
• Manter o contato dos filhos com a família do pai/mãe ausente; manter vivos os dados e as histórias vividas com o pai ausente; com sua história e processo
• Estabelecer relações de apoio e ajuda;
• Adequar a função e autoridade de avós que desempenham funções de pais;
• Manter a autoridade e a função parental do genitor presente.
• Possibilitar que todos os envolvidos acessem e lidem com seus sentimentos e/ou preconceitos; aceitando as mudanças, e as       dificuldades inerentes;
•  Avaliar e ficar atentos às necessidades de renegociações, de reformulações para as funções familiares serem cumpridas.

Sejam quais forem os modelos e configurações das novas famílias, o foco deverá ser sempre possibilitar que as tarefas e funções parentais sejam desempenhadas de forma adequada para o crescimento e desenvolvimento físico e emocional das crianças e adolescentes; e que as funções conjugais existam e se desenvolvam.

C. Desafios para o terapeuta

As soluções, tanto para as famílias como para os terapeutas, pressupõe abusar do bom senso e da criatividade.

Não existem verdades e muito menos mágica, mas sim trabalho constante no sentido de flexibilizar as posições, questionar os preconceitos e a rigidez, e estar sempre aberto a aprender e lidar com os sentimentos e dificuldades.

Todas as propostas de soluções são um desafio a vencer, pois significam encontrar uma forma nova para lidar com as situações, sem esquecer os sentimentos desencadeados e as pessoas envolvidas.

• Adaptar-se às suas condições familiares pessoais e acompanhar famílias com dificuldades semelhantes
• Lidar com a angústia de não saber o que é melhor, ao que encaminhar
• Liberar os filhos sem desautorizar os pais
• Enquadrar os filhos sem fazer pelos pais
• Responsabilizar sem culpar
• Aceitar um modelo de família diferente do padrão tradicional: tomando consciência dos sentimentos e preconceitos
• Flexibilizar, ter criatividade para possibilitar mudanças e arranjos necessários e funcionais

D. Como a Terapia Relacional Sistêmica pode ajudar

A Terapia Relacional Sistêmica tem alguns instrumentos que podem ser úteis no trabalho com famílias atuais:

• Posturas sistêmicas no atendimento e encaminhamento das situações
• Desenvolvimento de pertinência para a mudança
• Programa específico para cada situação
• Clareza no manejo das Funções Parentais
• Foco nas aprendizagens individuais, de casal e familiar
• Supervisão de pais
• Uso de rituais e técnicas “não racionais” na terapia
• Treino constante de focar no padrão de funcionamento
• Treino constante no uso do “Pra que”
• Uso da Auto supervisão

*Texto base do Workshop “As dificuldades e possibilidades do trabalho da Terapia Relacional Sistêmica nas famílias atuais”  realizado na VII Jornada de Terapia Relacional Sistêmica, 19/09/2015, Curitiba- PR