Filhos adultos morando com pais

Solange Maria Rosset

outubro de 2017

 

O casal que está numa fase mais madura do relacionamento deveria estar dedicando seu tempo e sua energia para reorganizar sua relação, usufruindo desta fase da vida e colocando em prática o que não pode fazer em fases onde eram mais jovens. No entanto, muitos casais que estão neste momento do ciclo de relacionamento, estão encontrando dificuldades para este exercício por estarem enfrentando uma questão cada vez mais recorrente nas famílias atuais: filhos adultos, muitas vezes economicamente estáveis, e que continuam morando sob o mesmo teto dos pais e mantendo o mesmo padrão de relação com eles que tinham na infância ou adolescência.

Esta é uma situação de muitas famílias atuais, e muitos elementos desencadeantes são responsáveis por esta situação. Esses filhos são uma geração que acredita que tem muitos direitos perante os pais; o excesso de cuidado dos pais pela segurança e bem estar dos filhos, justificado pelos riscos reais da vida hoje em dia e pelo desejo de darem aos filhos o que eles não receberam; o bom nível de energia e disposição dos pais que ainda se sentem capazes e disponíveis; e ainda muitas razões e justificativas específicas de cada família. 

O que acontece então, é que os pais continuarão gastando muito tempo e energia sendo pais e pouco sobrará para retomarem sua história de casal.  Nesta fase o casal deveria dedicar-se, juntos, avaliando sua vida em comum, trazendo à tona os planos e projetos que não conseguiram realizar e se dedicando a colocar os antigos e novos projetos em prática, recriando um espaço de intimidade, sensualidade e carinho, levando a um enriquecimento da relação dos parceiros e a uma reestruturação das questões individuais.

As dificuldades surgirão no momento que o casal estiver maduro e os filhos adultos, mas elas podem ser evitadas ou minoradas se forem prevenidas quando o casal é jovem e os filhos pequenos.

Os casais que se adaptam às mudanças da prole, sem deixar de manter o espaço e o interesse de casal terão mais facilidade em colocar limites nos filhos quando esses ficarem adultos.  Terão prevenido as dificuldades se, desde o início da união, os parceiros conseguirem manter atividades, interesses e relações de casal e pessoais. Ao terem filhos, precisam preservar o espaço, físico e emocional, bem como atividades e interesses particulares do casal, sem a participação e interferência dos filhos. Se mantiverem esses espaços, ao chegarem à fase em que voltarão a estar sozinhos, já terão o hábito, os compromissos e os prazeres individuais e de casal.

Manter a intimidade, a cumplicidade, a sexualidade e os projetos de casal são cuidados importantes. O casal que se esforça e se propõe a manter e desenvolver a vida íntima de casal não terá dificuldade em aquecê-la ou enriquecê-la na fase tardia da relação. O desenvolvimento e a execução de projetos comuns, materiais ou de outras áreas, também mantêm o casal com um nível de ligação e de afeto que torna a relação íntima e funcional.

Outra boa forma de ver a relação mais madura é procurar aprender o que não aprenderam nos anos anteriores. No excesso de atividades e responsabilidades, não se dá atenção às aprendizagens que podem ser feitas junto com o outro ou que um pode ter com as características e o funcionamento do outro. Assim, como casal eles podem avaliar, de forma realista, o que aprenderam, cada um com seu parceiro, o que poderiam ter aprendido e quais são as situações que lhes impediram de aprender; analisar de que forma ainda podem ter essas aprendizagens; avaliar o que poderia ter sido feito para terem uma vida mais saudável e funcional e o que os impediu de fazer. Tudo isso como um novo projeto, um novo crescimento pessoal e relacional.

Se a família está tendo esta questão de um filho que se mantém em casa e não vai alçar seu próprio voo, as aprendizagens devem ser realizadas de todos os lados, definindo tarefas e responsabilidades para o filho adulto, os pais assumindo sua vida pessoal e de casal, separando com clareza funções de pais de filhos adultos e funções de casal.

Antes de conversar com os filhos sobre as questões de convivência ou saída de casa é necessário que o casal converse entre si com clareza e bom senso. E só quando estiverem seguros das propostas e fortalecidos entre eles poderão redefinir com segurança e amorosidade as regras de convivência e responsabilidades e a forma que eles irão cuidar da sua vida. 

*Texto publicado na Coluna Amor da revista Caras, edição 1250 de 20/10/2017