Reflexões sobre ciúme*

Solange Maria Rosset

setembro de 2021

 

Ciúme é uma reação complexa a uma ameaça perceptível a uma relação valiosa ou à sua qualidade.

O ciúme é um sentimento de insegurança que vem do medo de perder uma pessoa, em que o maior desejo é preservar e permanecer em uma relação.

Ele se desenvolve quando sentimos que nosso parceiro não está tão estreitamente conectado conosco como gostaríamos.

Ele surge como um sinal de alerta, quando creditamos que algo não está indo bem ou como desejamos. Os ciúmes não nascem do que vemos, mas sim do que imaginamos.

O ciúme leve, tem a utilidade de fazer os envolvidos pensarem na sua relação, avaliarem sua forma de lidar com o outro e com a relação.

No entanto, o medo, constante, de ser enganado pode “sufocar” o outro e levar a pessoa ciumenta a perder-se de si.

O ciúme intenso sempre trará sofrimento para ambas as partes e coloca em risco o relacionamento.

O ciúme pode ser excessivo por várias razões. Entre elas:

Minha opinião: ciúme não é prova de amor, nem tempero para o amor, mas uma forma inadequada de lidar com as diferenças e eventos da relação. Pode ser um problema real ou estar presente apenas no imaginário.

Quando penso em ciúmes, relaciono com minhas crenças e posturas relacionais sistêmicas, olhando os seguintes aspectos:

a. Ciúme e padrão de funcionamento

Vários aspectos dos padrões de relação desencadeiam, mantém e pioram os ciúmes.

- Usar o ciúme como um meio de controle da pessoa que amamos

- Pensar que a outra pessoa com quem me relaciono é minha. O ciúme relacionado à posse, baseia-se na ideia de que (ele ou ela) é (meu ou minha).

- Romantizar e naturalizar demonstrações de ciúmes.

b. Ciúme e contratos relacionais

Relações que vão acontecendo, sem contratos, sem conversas sobre valores, desejos, dificuldades, etc deixam brechas que podem desembocar em sentimentos e crises de ciúmes.

c. Ciúme como álibi

d. Usar as reações de ciúme como culpa do outro, como sua carência e dificuldade, como prova do amor, entre outras explicações, pode se transformar em um álibi poderoso que não ajuda os envolvidos, e mantém o ciúme, as crises e as dores.

e. Ciúme como compulsão relacional

Algumas pessoas, por dificuldades pessoais, por terem tido aprendizagens familiares rígidas ou disfuncionais, irão reagir com sentimentos e comportamentos de ciúmes, como única ou mais forte resposta relacional.

e. Ciúme entre irmãos : Muitas vezes sem perceber, os pais ou a família, fomentam estes sentimentos nos filhos.

f. Ciúmes nas relações familiares – entre irmãos, entre pais pelos filhos, da relação dos pais.

Pensando nas possibilidades terapêuticas, alguns pontos são importantes:
Para começar, preste atenção em que momentos o ciúme surge. Observe a si mesmo, suas próprias reações e aprenda a lidar com elas. Antevendo seu sentimento, você pode procurar direcionar sua atenção para outras atividades e pensamentos.

Outro ponto importante na superação do ciúme é a honestidade. Se algo ou um comportamento está incomodando você, converse sobre isso com quem está sendo o seu objeto de ciúme. Uma conversa aberta e verdadeira pode gerar mudanças de hábitos e, consequentemente, o fim de desconfortos e crises de ciúme. Por isso, tenha consciência do seu próprio valor e não esconda os seus sentimentos. Ao ocultá-los, somos nós mesmos quem mais sofremos, nos isolando e nutrindo esse sentimento negativo.

Se comunique de forma assertiva!  Uma comunicação assertiva é, dentre alguns pontos importantes, saber como expressar seus sentimentos de maneira mais adequada, facilitando a resolução de problemas. Uma ótima dica é trocar as acusações por conversas francas.

Sentir ciúme é algo bem complexo. Separe alguns minutos para dar uma respirada, avaliar honestamente o porque, quais são seus gatilhos, de que modo você pode comunicar seu incomodo ao seu companheiro ou companheira. Avalie a relação, o que está sendo construído.

Lidar com a incerteza faz parte da vida! Checar mensagens, fazer interrogatórios e verificações não ajudam, mas fazem com que o ciclo do ciúme continue funcionando. Não é a intimidação do ciúme que faz com que o outro faça ou deixe de fazer determinada coisa. O que motiva o comportamento das pessoas são seus valores. Daí, a importância de escolher se relacionar com pessoas que possuam valores parecidos com os seus.

O ciúme gera o que chamamos de Inferência Arbitrária ou seja, a pessoa chega a uma conclusão sobre o outro, sem evidência alguma. Não devemos trabalhar com conjecturas numa relação, apenas com fatos.

Na maioria das vezes, o ciúme contém um elemento de dependência e medo de abandono. Pode-se aproveitar os momentos em que o ciúme surge para ver como ele é, como manipula, como impele contra as melhores intenções, aspirações, contra os melhores desejos. Isto é, utilizar a crise de ciúme para se dar conta da direção para a qual ele conduz. Ficar atento a essas pistas pode alterar a relação consigo mesmo e, por consequência, a atitude em relação ao outro. Estabelecidos os acordos de confiança e respeito, esses sentimentos tendem a perder força com o passar do tempo.

*Texto apresentado na VI Jornada do Amor “Qualquer maneira de amar, vale a pena?” na Elo Centro de Estudos.