Sexo e Relacionamento

Solange Maria Rosset

 

Desacerto na hora do sexo sugere problema mais amplo na relação

Dificuldades ligadas ao desempenho sexual muitas vezes aparecem como reflexo de questões mal resolvidas em outros níveis do relacionamento. É possível que um dos parceiros esteja, inconscientemente, se utilizando da frustração na cama como vingança por ressentimentos não expressos.Com certeza o diálogo é a melhor maneira de esclarecer a situação e revertê-la.

Uma boa vida sexual não é garantia de que o casal não terá problemas em outras áreas, mas certamente o torna mais unido e isso pode ajudá-lo a enfrentar certas questões familiares ou conjugais. Por outro lado, se a vida sexual não é boa, fica comprometida a parceria tão necessária nos momentos de adversidade. Por isso, as dificuldades sexuais não devem ser ignoradas ou menosprezadas.

A sexualidade pode realimentar o casamento, pois o sexo é uma forma de expressão afetiva, e o carinho, a compreensão e a admiração também realimentam a sexualidade. Quando o casal partilha idéias, cultiva a compreensão e a gentileza, tem ideais e projetos em comum, ir para a cama é fácil e estimulante. Se a rotina conjugal é de discussões, desqualificações, cenas de ciúme, desconfiança, o sexo pode continuar acontecendo, mas como um compromisso ou uma descarga biológica para aliviar a tensão. Nesse caso, é fatal que surjam dificuldades.

As pessoas são movidas pelo instinto de relação, e a sexualidade é um dos instrumentos relacionais. Assim, o distúrbio sexual pode ser a parte visível, perceptível, de problemas relacionais mais amplos. E, quando aparecem, podem piorar as coisas: o impulso sexual une as pessoas, mas as questões e dificuldades relacionais afastam-nas. Se um casal tem dificuldades sexuais e está disposto a lidar honestamente com a questão, chegará à compreensão dos entraves da relação. O conteúdo sexual mostra, metaforicamente, o que ocorre entre as duas pessoas e que, por não ser expresso diretamente, se transformou em um distúrbio sexual. A falta de respeito pelas características do parceiro, por exemplo, pode aparecer como falta de interesse sexual -- e, a mágoa pela desqualificação sofrida pode se mostrar por intermédio da ejaculação precoce ou da ausência de prazer. A supressão do diálogo pode resultar em desajustes na hora do sexo.

Mais íntima forma de contato entre duas pessoas, a relação sexual tem forte potencial simbólico. A intimidade realça eventuais conflitos e dificuldades dos parceiros ou da relação entre eles. Muitos sentimentos -- e ressentimentos -- não expressos acabam chegando à cama na forma de um distúrbio sexual. Casais que não discutem e não negociam suas diferenças, mas preferem, pôr panos quentes nos assuntos conflitantes, ou varrê-los para debaixo do tapete, empurrá-los com a barriga, vão armazenando mágoas que podem virar desejo de vingança. Tal desejo às vezes aparece como ejaculação precoce, dificuldades de ereção e de orgasmo, vaginismo, dificuldade de orgasmo, falta de desejo, passividade. O processo em geral acontece silenciosamente e sem consciência dos envolvidos. Algumas vezes, um dos parceiros até tem idéia do que ocorre mas o outro, não. É comum também que, mesmo percebendo que há algo errado, o casal prefira não dar importância ao problema.

No fim das contas, frustrar o cônjuge ou apontar as falhas dele por meio de relações sexuais fracassadas pode ser um bom plano de vingança. Na maioria das vezes, vem acompanhado de álibis protetores e poderosos, sem que se tenha consciência da armação. Dores de cabeça, cansaço e estresse surgem como boas desculpas.

A questão mais séria dessa situação é que ela pode se transformar numa bola de neve: quanto mais desacertos na cama, mais dificuldades relacionais; estas, por sua vez, acarretarão mais problemas sexuais, que trarão mais desencontros nos outros níveis da relação. Se não for interrompida, essa roda-viva só faz aumentar as mágoas e a solidão.

* Artigo publicado na Coluna AMOR da revista CARAS 712 de 29/06/2007