Sobre irritação e auto controle no relacionamento de casal

Solange Maria Rosset

fevereiro de 2018

 

Todos sabemos que a vida atual é repleta de questões e situações que despertam irritações e destemperos. Sabemos também que a relação de casal é um espaço onde as pessoas se sentem à vontade para colocar para fora todo o seu mal estar em cima do parceiro. Isto por ser esta a relação mais intima e próxima, onde fica fácil soltar os controles e cuidados que se tem com relações mais formais ou distantes. Em função de tudo isto, é comum vermos casais descuidados com o relacionamento a dois, e muitas vezes colocando a perder uma relação interessante e prazerosa.

Por outro lado, uma das funções do espaço de casal é servir de continente e cuidado das dores vindas das dificuldades externas. Conseguir exercer esta função de cuidado sem desabafar descontroladamente é um exercício de auto controle, que se realizado pelos dois parceiros pode melhorar a relação do dia a dia, desenvolvendo acertos e cuidados importantes.

O que mais pode atrapalhar neste momento é a crença de que está sendo vítima da maldade ou da má vontade do outro. Este pensamento leva a desenvolver defesas variadas, além de se sentir mal amado e com o direito de atacar. No entanto, saber que não existem “vitimas e bandidos”  num relacionamento conjugal, mas sim que é um jogo, uma dança conjunta, onde um passo ou um lance desencadeia o passo ou o lance do outro, é muito util nesses momentos.

Certamente na hora em que o outro despeja sua dor, raiva ou mal estar é inevitável sentir-se magoado. Mas, ter auto controle e não dar corda para a mágoa é uma medida de bom senso. Ampliar o pensamento e a avaliação pode ajudar a sair dessa armadilha, definindo novas formas de lidar com situações semelhantes.

Evitar a todo custo a explosão é um bom acerto entre casais que se propõem a ter controle sobre as dificuldades. Mas quando ela for inevitável, é muito util que já tenham conversado e acertado que nunca é bom os dois se irritarem ao mesmo tempo. Quanto mais a situação é complicada, mais a calma é necessária. Então, será preciso que um dos dois acione mecanismos que assegurem a calma de ambos diante da situação conflitante. Certamente na explosão dos dois juntos nada será feito de bom.

Outra forma de cuidarem um do outro é treinarem não gritar um com o outro. Sabemos que gritos são hábitos de família de origem, ou jeito pessoal de se comunicar, mas sabemos também que quem tem  bons argumentos não precisa gritar e nem impor pelos gritos aquilo que não consegue pelos argumentos e pela razão.  E é certo também que quanto mais alguém grita, menos é ouvido. Por isso, um casal que de comum acordo, combina nas horas de paz evitar gritos na hora da briga, está sendo hábil e criando um ambiente que facilitará o entendimento.

Perder uma discussão também pode ser um ato de inteligência e de amor. Uma discussão pressupõe um vencedor e um derrotado e rapidamente pode se transformar numa "guerra". Se o casal estiver preso nessa disputa os parceiros se transformarão em especialistas em acabar com o outro, vencê-lo e até aniquilá-lo. E o casal sempre perderá. Então, se por descuido a conversa ou o desabafo se transformar em discussão, permitir que o outro "vença" por escolha e estratégia para não cair na armadilha da guerra, pode ser uma boa proposta para que mais rapidamente ela termine. E, se isso fizer parte do combinado do casal, eles vão lembrar na hora do destempero, e um ou outro poderá controlar a situação.

*Texto publicado na Coluna Amor da revista Caras, edição 1267 de 16/02/2018