Terapia de Família Relacional Sistêmica

Capítulo da Revista Brasileira de Terapia Familiar

Vol 1 - Número 1 - Janeiro/Junho - 2008

Solange Maria Rosset*

julho de 2008.

 

Resumo

A Terapia Relacional Sistêmica é uma proposta de trabalho terapêutico com famílias, casais e indivíduos e grupos. É uma integração das idéias e enquadres do Psicodrama, da Terapia Corporal e de Energia e da Terapia Sistêmica. O ponto central dessa abordagem é o trabalho com Padrão de Funcionamento. Através da relação terapêutica, o terapeuta irá auxiliar os clientes a terem consciência do seu padrão de funcionamento e a desenvolverem as aprendizagens e as mudanças necessárias. O trabalho clínico com famílias estrutura-se a partir do encaminhamento e dos primeiros contatos, buscando-se criar uma programação específica para cada família, coerente com os objetivos acordados.
Palavras Chave: Padrão; Funcionamento; Famílias; Programação.

Abstract

Systemic Relational Therapy is a proposal to provide therapy for families, couples, individuals and groups. It is the integration of ideas and the framework applied by Psychodrama, Body and Energy Therapy, and Systemic Therapy. The core point of this approach is the employment of the Operating Standard. The therapeutic relationship enables the therapist to raise the awareness of patients to their operating standards and to help them develop the required knowledge and changes. Clinical work carried out with five families is structured based on the guiding procedure and first contact to build a specific program for each family, coherent with goals agreed upon.

Key-words: Standard; Operating, Families; Program.

 

1 Terapia Relacional Sistêmica

1.1 Histórico

A estruturação da Terapia Relacional Sistêmica aconteceu no Núcleo de Psicologia Clínica de Curitiba, PR, na década de 1980. Por ser a síntese e integração de muitos anos de trabalho, várias influências teóricas e técnicas somaram-se à experiência, à reflexão e ao desenvolvimento pessoal de suas sintetizadoras. No entanto, para compreender quais aspectos são particulares da Terapia Relacional Sistêmica, torna-se necessário delimitar as influências mais significativas:

Do Psicodrama, foi incorporada a proposta básica da Relação Terapêutica, bem como o trabalho focado no momento, no aqui e agora, e a noção de contextos (social, grupal, psicodramático) e níveis. Usam-se, também, as teorias de Matriz de Identidade e Núcleo do EU para a compreensão do desenvolvimento, além do instrumental técnico. 

Da Terapia Corporal e de Energia, foi adotada como base a Compreensão Energética dos seres vivos (fluxo, carga, descarga etc.) bem como a teoria do desenvolvimento (caráter) para compreensão do funcionamento. Também é usado o seu arsenal técnico e a permissão para o contato corporal com o cliente.

Da Terapia de Sistemas Familiares, foram adotadas a leitura sistêmica das situações, bem como a postura básica de que a responsabilidade do processo é do cliente e de que o foco da terapia é a mudança. Foram usadas, ainda, as intervenções sistêmicas, a instrumentação do tempo (tarefas, intervalos etc.) e o planejamento dos atendimentos, visando à eficácia e ao enquadre básico sistêmico para o processo terapêutico. As idéias básicas do trabalho foram fortemente influenciadas pelas propostas terapêuticas de Maurizio Andolfi, Carl Witaker, Salvador Minuchin e Virgínia Satir (Rosset, 2001a, p. 123-127).

Em 1993, a autora encerrou o trabalho com a equipe do Núcleo de Psicologia Clínica e iniciou uma reorganização da Terapia Relacional Sistêmica até chegar às definições técnicas e clínicas que hoje norteiam este trabalho.

1.2 Pressupostos

Na compreensão relacional sistêmica, a qualidade de vida de um indivíduo depende do nível de consciência que ele tem das suas escolhas e da responsabilidade que ele tem com suas mudanças.

A preocupação relacional sistêmica é de enxergar o quê está acontecendo e de que forma. Então, o foco não é no passado, buscando-se algo ou alguém culpado pelo que aconteceu, mas no presente, avaliando-se quem está envolvido na situação, de que modo, quais são os padrões relacionais que estão ocorrendo. Assim, mais importantes do que os conteúdos são os padrões de interação e funcionamento, sempre conectados com o momento e o contexto, buscando-se novas alternativas de funcionamento e mudança.

Aprender a ver os padrões de funcionamento é como solucionar um quebra-cabeça: uma peça de cada vez, sem aparente ligação com a figura; então, de um momento para o outro, fica claro o objetivo, o jogo, o padrão.  Então, o primeiro passo para ter controle sobre padrões repetitivos é aprender a enxergá-los. Só após isso se pode saber quais as aprendizagens são necessárias, qual é o caminho para ficar “dono de si”, dono dos seus comportamentos. 

Desenvolver a consciência do próprio funcionamento e da responsabilidade pelas escolhas elimina completamente a culpabilidade. Não existe mais crítica a si ou aos outros, mas sim um estado de coisas, um funcionamento, um aspecto para ser flexibilizado e ampliado.

Pensar dessa forma traz à tona a questão de que não existem vítimas ou bandidos, culpados ou inocentes. Acreditar que os lances de relacionamento são circulares, são co-desencadeadores e que o comportamento de um desencadeia e mantém o comportamento do outro, e vice-versa, abre novas possibilidades de compreensão. Dependendo do ponto em que a atenção é colocada, pode-se enxergar diferenças totais no desenvolvimento das seqüências comportamentais. Se compreender que todos são parceiros na situação, todos passam a ser completamente responsáveis pelo que acontece; passam a ser responsáveis e potentes: podem desencadear, mudar o andamento, encerrar.

A família tem potencial e potência de atrapalhar ou de curar os seus indivíduos. Se compreenderem que têm sua própria competência interna, seus membros poderão sempre acionar esses instrumentos para cuidar-se, proteger-se, curar-se e, assim, poder crescer, aprender e enriquecer sempre mais.

A família em si é uma unidade, como um organismo, em que todas as partes estão ligadas e interagem. Há um movimento contínuo, circular, de trocas entre o sistema familiar e a estrutura individual. Dessa forma, o indivíduo é um elemento potencial de entrada de novos estímulos no sistema, ao mesmo tempo em que vive complexidades, contradições e conflitos dentro da rede interacional, a qual compreende não só a família atual, como a trigeracional.

A família passa por ciclos e, de diferentes maneiras, busca manter um equilíbrio. Duas idéias são importantes com relação aos ciclos vitais. Uma delas é de que cada ciclo traz uma aprendizagem específica, algo que precisa ser conquistado ou algo que precisa ser deixado de lado. Essa compreensão leva a ver a entrada e saída nas fases de desenvolvimento realmente como etapas de aprendizagens, como níveis a serem alcançados. A outra idéia é de que as famílias estão em constante transformação; então, sempre haverá pessoas em fases diferentes. Portanto, a família é o espaço especial para as aprendizagens necessárias em cada etapa (Rosset, 2003, pp. 47-64).

Os sistemas (família, casal, indivíduo, grupo, instituição) funcionam com um quantun de energia e vitalidade, de forma flexível e fluída ou congelada e repetitiva. A forma de circulação da energia determina o nível e a quantidade de saúde do sistema.

Cada sistema tem seu próprio Padrão de Funcionamento. Trabalhar descobrindo e alterando esse padrão é uma das razões da psicoterapia.

1.3 Postura Técnica

A tarefa do terapeuta relacional sistêmico é auxiliar seu cliente a ter consciência do seu padrão de funcionamento e, a partir disso, ajudá-lo a desenvolver as aprendizagens que são necessárias e as mudanças pertinentes.

Trabalhar com o padrão de funcionamento do cliente é um processo que necessita inicialmente de uma certeza do terapeuta: a de que esse é o aspecto que possibilita mudanças estruturais no indivíduo e na sua rede de relações. A partir disso, o terapeuta irá sempre ouvir e perceber o que acontece, mas estará conectado para ver o funcionamento que está por trás e que dá suporte para aqueles conteúdos e comportamentos.

O foco básico do terapeuta é enxergar e adequar-se ao que é útil para o cliente naquele momento específico. Não importa o que o terapeuta sabe ou compreende do cliente, mas sim sua habilidade em colocar o que sabe e vê como instrumento de auxílio para o cliente, dosando as informações, as interpretações e as marcações.

No trabalho clínico,

trabalha-se com a identidade familiar e a identidade pessoal nas vertentes do pertencer e do diferenciar-se (Rosset, 2003, pp. 123-124; Bowen, 1991);

1.4 Padrões de Funcionamento

A terapia relacional sistêmica (Rosset, 2005) foca o seu trabalho no padrão de funcionamento. Padrão de funcionamento (Rosset, 2004, p. 7; 2005, p. 189-190) é a forma repetitiva que o sistema usa para responder e reagir às situações da vida e às situações relacionais. Engloba o que é dito e o que não é dito, a forma como são ditas e feitas as coisas, bem como todas as nuanças dos comportamentos. Fazem parte do padrão de funcionamento as compulsões básicas, as defesas automáticas, os jeitos, os álibis prediletos. O padrão de funcionamento aparece em todos os aspectos da pessoa ou do sistema. Pode ser visto no corpo, no pensamento, no sentimento, na ação e, especialmente, nas relações (Silverberg, 2005). Na maioria das vezes, ele é inconsciente e automático.

Esse padrão estrutura-se na entrada da criança no sistema familiar, a partir da forma como a família atua o seu padrão básico. Através do olhar trigeracional, pode-se ver o padrão de funcionamento das famílias de origem dos pais, o padrão de cada um dos cônjuges/pais, a estruturação do padrão familiar, a influência/determinação no padrão dos filhos e, assim, sucessivamente. Tal padrão constrói-se no entrelaçamento das relações familiares, através das normas explícitas e das regras que são passadas de forma sutil, nos olhares, nos toques, nas palavras e nos atos. Os padrões de funcionamento mantém-se, independente das mudanças dos conteúdos, dos fatos e das explicações.

O terapeuta que desejar trabalhar com os padrões de funcionamento do cliente precisa, primeiramente, desencantar-se com o conteúdo e o enredo das histórias relatadas na sessão. É necessário que ele acredite que o padrão aparece na Forma, e não no Conteúdo.

É necessário, também, que o terapeuta desapegue-se do mito de que o importante é saber o porquê e as causas dos sintomas e comportamentos. Só com esse desapego ele conseguirá exercitar-se na compreensão de que os eventos são multicausais e que a verdade é relativa. Dessa forma, poderá se aventurar por explicações cada vez mais complexas dos inúmeros desencadeantes e das razões para eles.

Ele precisa, também, aceitar que um mesmo comportamento, fato ou sintoma, pode ser funcional ou disfuncional, compreendendo que funcional é algo que leva à aprendizagem, ao crescimento e à mudança, bem como é coerente com o contexto de tempo e espaço e com o sistema que o desenvolve.

Saber que um padrão não é bom nem ruim, mas simplesmente é, é um fator primordial para o terapeuta poder acompanhar seus clientes no trabalho com padrões de funcionamento, sem juízos de valores, sem pré-definições, sem desejos que o cliente faça o que parece mais correto para o terapeuta.

O padrão de funcionamento de uma família pode ser visto na forma como os seus elementos desenvolvem seus jogos relacionais e usam as depositações, o que é dito e o que não é dito, o que se e se ouve nas entrelinhas, como eles lidam com as diferenças, com as brigas e com os aspectos de dependência/independência.

Outros aspectos que também servem para avaliação do padrão de funcionamento são comunicação, lazer, sexualidade, profissão, vestuário, tarefas comuns, saúde, corpo e sintomas.

No processo terapêutico, a família vai se trabalhando e flexibilizando aspectos do seu padrão de funcionamento. A forma, a velocidade, os encaminhamentos e as estratégias para isto serão definidos de acordo com o manejo do terapeuta (sua experiência, seu próprio padrão de funcionamento, suas vivências pessoais de família e com famílias) e com as disponibilidades e possibilidades dos clientes (o quanto eles estão envolvidos na tarefa, o nível de pertinência para a mudança, o quanto de consciência e responsabilidades eles têm sobre seu padrão e suas escolhas individuais, de casal e de família).

 

2 Terapia Familiar Relacional Sistêmica

2.1 Pressupostos

A partir do momento que a família compreende o que são Padrões de Funcionamento, ela inicia seu processo de mudança. No entanto, a palavra-chave para ser lembrada é processo. Isso significa que nada ocorre rapidamente, que nada ocorre isolado, nada ocorre sem trabalho, sem idas e vindas. O processo de mudança inicia-se, então, ao se tomar contato com a noção de padrão de funcionamento e passa por etapas, passos, momentos e movimentos, ligados a: entrar em contato com seus funcionamentos; descobrir como, o quê e quando acontecem; trabalhar descobrindo para quê (Rosset, 2005, p. 207) se faz determinada ação/reação; desenvolver o desejo de mudar, que implica na energia necessária; criar a vontade de mudar, que implica na ação; desenvolver as aprendizagens necessárias, que ficaram faltando nas etapas de desenvolvimento ou que o momento está exigindo; planejar as estratégias da mudança; experimentar e pôr em prática as novas possibilidades; treinar, treinar, treinar, até que passe a fazer parte do seu jeito de ser. Além disso, sempre estar atento ao risco das recaídas (Rosset, 2001a, p. 107) e às novas mudanças que surgirão.

Ao passar a ter consciência e controle das compulsões relacionais, começa-se a ter possibilidade de fazer reais escolhas; escolhas com alegria de viver, com a qualidade de vida que estava estocada em algum lugar e controlada pelos padrões inconscientes e rígidos.

Para que uma família mantenha-se viva e em funcionamento, precisa contar com objetivos em comum, que lhe apontem o norte, contribuindo ativamente para seu equilíbrio e coesão. Existem alguns indicativos de funcionalidade familiar. Eles não são lineares, nem servem para todos e em todos os momentos, mas ajudam os pais que querem ter uma ação eficiente na formação de filhos úteis e saudáveis. Uma família funcional precisa treinar os aspectos descritos a seguir.

Continência – A família tem a capacidade de dar apoio aos seus membros nas horas de alegria, de dificuldades, de frustrações, de perdas, de erros.

Pertencimento – Os membros da família têm certeza de que fazem parte de uma família: ela é única, tem características próprias, aspectos positivos e negativos específicos, mas é a sua família; é para onde se pode voltar a qualquer momento; é o que dá definição de muitas das suas características pessoais.

Crescimento e libertação – O movimento familiar qualifica e estimula a diferenciação e a independência de seus membros, possibilitando experiências individuais que abrem espaço para novas aprendizagens e novos movimentos, facilitando as mudanças individuais.

Tarefas do ciclo vital – As famílias desempenham tarefas e funções pertinentes a cada ciclo de desenvolvimento familiar; as quais são diferentes e necessárias quando se tem criança pequena, adolescentes ou adultos, por exemplo.

Circularidade e comunicação – As famílias não têm assuntos ou situações tabus, não retêm as informações sobre fatos, desejos ou sentimentos; nelas, tarefas, funções, direitos e deveres circulam entre as pessoas de acordo com o momento e a necessidade.

Regras e normas – Nas famílias, existem regras de funcionamento, fluxos e rotinas, e esses mecanismos são explícitos, negociados na medida da possibilidade, flexíveis para se adaptarem ao momento, à fase em que a família está e às necessidades.

Subsistemas claramente definidos e fronteiras claras e permeáveis – Todos da família sabem quem faz parte e participa de cada grupo familiar, quem pode fazer parte e mudar de grupo, dependendo das tarefas e funções de cada um.

Hierarquia – As famílias explicitam e desenvolvem as questões hierárquicas, sem rigidez, mas de acordo com funções e necessidades.

2.2 Técnica

O trabalho clínico relacional sistêmico (Rosset, 2001a; Souza & Rosset, 2006) é direcionado para auxiliar a família a:

Para desempenhar essa tarefa, o terapeuta irá trabalhar descobrindo e focando os padrões, os álibis, o funcionamento da família, de forma a poder:

O trabalho inicia-se na avaliação de quem fez o encaminhamento. Com o desenvolvimento da prática clínica nesse enfoque, o terapeuta vai mapeando as suas fontes de encaminhamentos e os padrões repetitivos nos clientes que vêm de cada uma delas. Então, a partir de saber quem encaminhou o cliente, o terapeuta já pode ir levantando suas primeiras hipóteses.

Os dados que a secretária passa (ou que estão na secretária eletrônica) sobre o pedido que o cliente faz (quem ligou, para quem é o pedido, o que é falado, como é falado, entre outros) vão dando pistas e formando novas hipóteses ou reforçando as já existentes sobre o funcionamento daquele sistema que está fazendo contato.

Dessa forma, o terapeuta irá fazer seu primeiro contato, pelo telefone, já com vários dados e várias hipóteses sobre o padrão de funcionamento da família específica. Esse primeiro telefonema é dado para a pessoa que fez o pedido, clareando o que está acontecendo, quem quer o atendimento, quais são as pessoas envolvidas e quais são os membros da família. Se necessário, será redefinido o pedido e o enquadre, bem como será marcada a primeira sessão com todos os membros da família nuclear.

Na primeira sessão, o terapeuta terá um protocolo com passos ou etapas (Vincular, Levantar a queixa, Circular, Redefinir, Definir Objetivos e Contratar) que servem como um mapa para encaminhamento do primeiro encontro terapêutico e que podem ser seguidos, ou não, dependendo das contingências específicas do momento, da situação, da problemática, da necessidade dos clientes e do terapeuta. Esse protocolo é um instrumento de auxilio para não se emaranhar nos conteúdos, e não uma cangalha para amarrar e conter o terapeuta. O foco da sessão é colher os dados de identificação e das relações entre todos os participantes, os dados referentes à queixa, às tentativas feitas para resolver a questão e ao posicionamento de cada membro sobre o que está acontecendo. Também são levantados os outros sintomas e queixas que existem na família com relação a todos os familiares, além do elemento que desencadeou a vinda da família.

Também vão sendo feitas as redefinições com relação às leituras lineares que a família traz da situação e às premissas simplificadoras. É um momento muito importante, pois dele depende a possibilidade de criar novas alternativas, novas leituras que possibilitem o trabalho terapêutico. É imprescindível que as redefinições sejam realizadas com clareza e firmeza, mas com respeito e compaixão pelas dificuldades e dores da família.

A partir dessas redefinições, vai se trabalhar com o foco na definição de quais são as aprendizagens e as mudanças que a família como um todo, cada um dos subsistemas e cada membro individual precisam, enxergam como necessárias e querem realizar.

Durante toda essa fase, o olhar do terapeuta será muito menos para os conteúdos relatados, e muito mais para o padrão de funcionamento da família.

Dependendo do quanto uma família enxerga do seu funcionamento, da habilidade do terapeuta e de outras condições do contexto, essa fase pode durar de uma a quatro sessões

Na avaliação do sistema que está pedindo a terapia também é utilizada a proposta técnica/teórica de Terapia Breve de Kesselman (1985).

Essa proposta define que, antes de programar-se uma sessão ou um processo terapêutico, é importante levar em conta os quatro momentos de um evento, ou princípios básicos para o planejamento, e os seis tópicos constantes de funcionamento.

Os quatro momentos (Kesselman, 1985, p. 39-41) são: logística, estratégia, tática, e técnica.

Os seis tópicos constantes do funcionamento (Kesselman, 1985, p. 34-36) são: pertenência, pertinência, comunicação, aprendizagem, cooperação e tele.

O processo terapêutico estrutura-se a partir da definição de objetivos terapêuticos. A definição de objetivos deve servir como um fio condutor que auxilia o terapeuta a manter a coerência do processo, ser um aliado do terapeuta, e não um mecanismo que maniete o terapeuta. Quando a família chega, tem seus próprios objetivos que podem ser coerentes (objetivo pertinente, viável, mensurável, terapêutico), confusos (desejo de mudança para outra pessoa que não está presente na sessão ou é etéreo, é gasoso), inviáveis (desejo de coisas que não são possíveis de serem alcançadas). No caso dos objetivos coerentes, o terapeuta vai juntar suas forças às da família para definir uma ação terapêutica. Nos outros casos, o terapeuta deverá redefinir os objetivos (para que o cliente compreenda, mude e transforme o seu primeiro objetivo em algo trabalhável) ou trabalhar com o cliente durante um tempo com o foco no desenvolvimento de pertinência para a mudança (o objetivo dessa etapa seria definir um objetivo trabalhável).

Então, estrutura-se uma programação do processo terapêutico, em função do que cada cliente necessita para atingir tais objetivos acordados ou redefinidos. Essa programação é um auxílio para que clientes e terapeuta saibam para onde estão caminhando e para quê. A programação só tem funcionalidade se for acompanhada de avaliações constantes e com a possibilidade de redefinição dos objetivos, do caminho ou da proposta terapêutica. 

2.3 Instrumentos e encaminhamentos

A partir do que for acordado nessa primeira etapa, que pode constar de uma ou várias sessões, inicia-se o processo terapêutico da família.

Os encaminhamentos dependerão da situação da família, da urgência dos sintomas, das disponibilidades e das necessidades das pessoas envolvidas. Todas as decisões deverão ser coerentes com o padrão de funcionamento da família e úteis para que os elementos possam enxergar o seu funcionamento e desenvolver aprendizagens e mudanças. O terapeuta precisa, pois, estar muito atento para não ser conivente com os padrões disfuncionais do sistema familiar.

Poderão acontecer sessões ou etapas de trabalho com toda a família, só com os pais, só com os filhos ou individuais. O foco dessas sessões poderá ser nas relações familiares, nos cônjuges, nos pais, no processo individual.

No desenrolar das sessões, são utilizados todos os recursos que parecerem úteis para atingir os objetivos de cada trabalho. As tarefas e prescrições para serem feitas na sessão ou no intervalo entre elas têm como função esticar para o dia a dia os temas e os climas de dentro das sessões, bem como instrumentar e dar condições para que as aprendizagens se realizem.

O uso de rituais terapêuticos na terapia de família é muito útil como elemento de apoio e contenção de emoções muito fortes e desorganizadoras, para possibilitar a expressão e experimentação de coisas que são difíceis de serem postas em palavras, como também para trabalhar com aspectos que são contraditórios, paradoxais ou inconscientes.

A flexibilização na definição do intervalo entre as sessões é utilizada para dar o tempo necessário: para digestão e reestruturação quando as sessões forem muito intensas nas emoções ou desorganizações; para que eles tenham tempo necessário a fim de desenvolver determinadas tarefas que necessitam de tempo mais longo ou sem pré-determinação; ou para quando faz parte das aprendizagens da família ou de algum dos seus elementos lidar com as questões de dependência, independência, autonomia, escolhas e responsabilidade.

 

3 Conclusão

A Terapia Relacional Sistêmica não é um modelo fechado, mas sim um processo em desenvolvimento. A partir das idéias iniciais, ele tem se enriquecido com cada aluno que termina sua formação e transforma-se num terapeuta que, seguindo a proposta básica, acrescenta sua experiência e suas reflexões.

 

Referências

Bowen, M. (1991). De la familia al individuo. Barcelona: Paidós.

Kesselman, H. (1985). Las bases de la planificación. In _____. Psicoterapia breve (p. 33-43). Madrid: Editorial Fundamentos.

Rosset, S. M. (2001a). Izabel Augusta: a família como caminho. Curitiba: Editora do Chain.

Rosset, S. M. (2001b). Padrão de interação do sistema terapêutico. Texto apresentado no 13. Congresso Internacional de Terapia Familiar da IFTA, Porto Alegre.

Rosset, S. M. (2003). Pais e filhos: uma relação delicada. Curitiba: Sol.

Rosset, S. M. (2004). 123 técnicas de psicoterapia relacional sistêmica. Curitiba: Sol.

Rosset, S. M. (2005). Terapia de casal relacional sistêmica. In _____. (Org.), Relações de casal: tempo, mudança e práticas terapêuticas (p. 175-181). Curitiba: Sol.

Silverberg, F. (2005). Como quebrar padrões e rotinas e mudar de vida. Rio de Janeiro: Campus.

Souza, D. S. & Rosset, S. M. (2006). A magia da mudança. Curitiba: Sol.


* Psicóloga, terapeuta relacional sistêmica, APrTF, professora e supervisora em cursos de formação.